Depois do furacão que foi o impacto da covid-19 em março, mês de quedas vertiginosas nos mercados de ações e até na renda fixa, em abril colocamos os pés no chão e voltamos a um patamar racional no mundo dos investimentos. Porém, ele segue arisco, como não poderia deixar de ser. Ainda temos muito a trilhar rumo à recuperação consistente do mercado financeiro pós-pandemia covid-19.
Para falar desta caminhada, convidamos Rafael Ribeiro da Silva, Portfolio Specialist da BRAM – Bradesco Asset Management, um dos gestores do seu plano de aposentadoria aqui na Funsejem.
Dentre os temas abordados estão: como se posicionar diante de alta volatidade e juros baixos, oportunidades de investimentos para o pós-pandemia, projeções do PIB brasileiro e muito mais.
Sinais da recuperação
O que vimos em abril foi muito mais uma estabilização pontual do que aconteceu no mercado financeiro em março, mês completamente atípico, em que beiramos a irracionalidade. Os investidores se desfizeram a qualquer preço dos ativos para ter o dinheiro em mãos ou em um ativo de segurança. Ninguém fez conta naquele momento para ver se fazia sentido ou não manter sua alocação devido ao cenário. Foi desespero, pânico total.
A estabilização de abril refletiu a acomodação e precificação na curva de juros dos vencimentos dos investimentos de renda fixa, e a precificação da política monetária de corte de juros do Banco Central, que aliado ao governo tenta atenuar minimamente os efeitos negativos da crise sobre a economia.
Na renda variável, bolsa de valores, também houve diminuição da tensão. Atrelado a isso, estamos vendo uma recuperação dos mercados no exterior, o que acaba nos puxando.
Volatilidade à espreita
Nós não temos expectativa de um mês similar a março, mas a volatilidade está aí. Ela chegou principalmente porque a taxa de juros está em um patamar muito baixo. Isso faz com que as pessoas busquem ativos mais arriscados, na tentativa de um retorno maior. Essa realocação traz volatilidade porque as pessoas muitas vezes não suportam o risco e desmontam suas carteiras quando percebem algum estresse.
O mercado permanecerá volátil e ainda sem uma estabilização consistente principalmente porque agora a gente passa a ter ruídos de todos os lados. Primeiro, na economia. Precisamos saber qual será o efeito real de todo esse tempo em que estamos parados em virtude da pandemia da covid-19. Também teremos ruídos do lado político, que podem não anular, mas tendem a piorar as expectativas de reformas programadas pelo governo.
Como se posicionar hoje
O nível de taxa de juros interfere no comportamento do investidor. Com taxas mais altas, você não precisa se preocupar muito, é só fazer uma alocação passiva em pós-fixado e ela vai te remunerar. Mas por enquanto temos uma taxa de 3% ao ano, e em queda – a gente espera que ela atinja 2,75% ou abaixo. Então quem desejar um mínimo de retorno acima da taxa básica de juros vai precisar assumir certo risco e aceitar um pouco de volatilidade. Mesmo que a gente esteja falando de fundos de crédito privado, conhecidos pelo diferencial que têm com o emissor, a empresa, e pelo retorno superior à taxa básica de juros. Esses ativos hoje têm uma “marcação a mercado” melhor, mais apurada, têm tido uma negociação maior e uma certa volatilidade.
Claro que nos investimentos tudo deve estar muito relacionado ao perfil de risco da pessoa. O ultraconservador, que não aceita nada de risco, vai ter que se contentar com os patamares de juros atuais, pois ele não suportaria ter volatilidade na tentativa de um retorno melhor. Agora o investidor que já tem um pouco mais de apetite, precisa, sim, assumir um pouco mais de risco. Isso não significa pegar o portfólio inteiro e alocar na renda variável. Na renda fixa ativa, em fundos com mais de risco, já é possível buscar retornos superiores ao CDI, à taxa básica de juros. Mas como hoje o risco está mais exacerbado, faz mais sentido esperar por mais visibilidade com relação à economia, para então fazer as realocações.
Daqui para a frente é importante não realizar realocações bruscas, tentando acertar o momento de mercado até porque, aqui no nosso caso, estamos falando de previdência complementar, recursos para o futuro das pessoas e dos que já estão recebendo a aposentadoria.
O mercado permanecerá volátil e ainda sem uma estabilização consistente principalmente porque agora a gente passa a ter ruídos de todos os lados.
Perspectivas 2020
Normalmente preparamos cenários prospectivos, mas a visibilidade está tão curta, que nossos cenários são muito mais simulações baseadas em comportamentos vistos na China, Coreia do Sul, Ásia e Europa, que estão saindo do pico da crise, do que simplesmente tentar projetar algo com base nos modelos econométricos que conhecemos.
Então observamos os acontecimentos aqui no país, e havendo uma similaridade com o que se passa lá fora, vamos trabalhando. A gente espera que o pior impacto da crise com a covid-19 seja agora no 2º trimestre, ainda com confinamento. No 3º trimestre, esperamos lockdown (fechamentos de cidades) cíclicos, acontecendo apenas onde o impacto da covid-19 é maior, com um retorno econômico lento, e então um 4º trimestre se recuperando. Mas a gente projeta terminar o ano com um PIB de 4,4% negativo, e só em 2021 ter uma recuperação forte, com mais tração para atingir, no mínimo, o piso do que foi antes de tudo isso.
Ressalto apenas um ponto que nos chama a atenção e pode afetar a recuperação de todas as economias: a parte fiscal. O quanto os governos estão gastando para poder passar por este momento. Hoje o nível de endividamento que os Estados Unidos esperam alcançar está mais ou menos no mesmo patamar da dívida do país na 2ª Guerra Mundial. É muito dinheiro, é um fiscal que vai sendo prejudicado e se deteriorando daqui para a frente.
Pós-pandemia: mercados a observar
Economias mais desenvolvidas tendem a se recuperar com mais robustez depois de passado o estresse, porque têm empresas maiores e um mercado mais evoluído. Investimento no exterior então faria sentido. O bom é que a recuperação dos outros países tende a nos trazer, a nos puxar também, diminuindo um pouco o risco local.
E aí o mercado se recuperando, teremos, do lado das empresas, aquelas que são boas geradoras de caixa, como as do setor de saneamento, e empresas grandes com um financeiro forte, que conseguem captar linhas de crédito mais facilmente. Na renda fixa, temos os títulos atrelados à inflação, e a taxa está muito baixa. Então com a volta da atividade econômica, talvez faça sentido ter alocações nestes títulos, para pegar a inflação que possa surgir. Em resumo, é um misto de exterior, um pouco de investimento em renda variável em setores como os que mencionei, que é onde estamos alocados hoje na BRAM, e títulos de inflação.
Carteira ALM: comportamento esperado
Obs.: o plano VCNE da Funsejem, fechado para adesões, tem um grupo de aposentados com renda vitalícia cujo patrimônio é investido em uma carteira ALM, gerida pela BRAM Asset.
É uma carteira diferenciada por ter um passivo que acaba norteando todas as alocações. Então temos os vencimentos projetados pelo atuário, e o que se espera de recursos em algumas janelas futuras. Isso nos dá toda a base sobre o que fazer de alocação. Um fator importante, que deve ajudar, é que em momentos de maior estresse como março, as taxas reais dos ativos em títulos atrelados à inflação subiram bastante. Portfólios que fizeram realocação neste momento têm uma carteira mais alinhada com o passivo, ou seja, uma carteira onde a taxa de juros alocada real está mais próxima do que é a taxa do passivo. É uma carteira que vai ter volatilidade ainda, mas ela passa a ter um diferencial, ter oportunidades de estar mais bem alocada. Não que vá haver retornos melhores a partir de amanhã, mas ela está bem alocada para suprir os passivos mais à frente, que é o que importa no caso de renda vitalícia.
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Sempre alerta!
Quando o assunto é investimento, sua análise precisa se basear no momento pelo qual passa o mercado financeiro, nas características da aplicação, e na adequação ao seu perfil de investidor. Os desempenhos, sejam de sua carteira pessoal ou da sua modalidade de investimento no plano de aposentadoria da Funsejem, devem ser considerados apenas como referência de gestão, e não como fator determinante para sua escolha, pois resultados passados não garantem rentabilidade futura.