A alta na taxa básica de juros, a Selic, não é uma novidade para os brasileiros e tão pouco uma realidade apenas do Brasil. Atualmente, a taxa está em 13,25% ao ano. Segundo o professor do curso de Economia e coordenador da pós-graduação do Ibmec-MG, Hélio Augusto de Azevedo Rabelo Berni, taxas de juros mais altas são um fenômeno mundial pós-pandemia.
“Um conjunto de fatores tem influenciado o aumento da taxa de juro desde a pandemia de covid-19, como a escassez de bens, alimentos, energia, elevação do câmbio, entre outros”, explica.
“No caso do Brasil, especialmente no fim de 2024, o aumento do câmbio contribuiu muito para isso. Imagina uma empresa que importa uma matéria-prima para produzir um bem final aqui no país. Com o câmbio mais alto, o custo financeiro dessa operação fica mais caro e esse custo é repassado para o consumidor final.”

Mas não é somente esse cenário que influenciou o aumento da Selic. “Também tivemos sazonalidade de oferta e demanda que levaram ao aumento de alimentos como a carne”, aponta o professor. O preço da carne subiu 7,54%, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) entre outubro e novembro de 2024. Além disso, as elevações acumuladas nos preços dos grupos Saúde e cuidados pessoais (6,09%) e Transportes (3,30%) também tiveram impactos significativos sobre o IPCA do ano. Esse ritmo mais forte na elevação dos preços resultou em um IPCA de 4,83 em 2024, deixando a inflação do Brasil acima da meta que era de 3,0%, com tolerância de 1,5%. “Na hora de calcular o Índice Nacional de Preços é levado em consideração um conjunto de bens e tivemos vários grupos que sofreram aumentos significativos. Portanto, a autoridade monetária do país precisou utilizar o aumento da taxa básica de juros, a Selic, para frear a demanda agregada da economia”, explica prof. Hélio. Isso acontece porque desde 1999 o país tem um regime de metas de inflação. O Conselho Monetário Nacional (CMN) define a meta de inflação por um período, geralmente, um ano, e o Banco Central (BC) é responsável por controlá-la por meio do Comitê de Política Monetária (Copom), que acompanha e persegue a meta para manter a inflação em níveis baixos. Desde que o regime de metas foi adotado, essa é a oitava vez que o objetivo foi descumprido, sendo as outras vezes em 2022, 2021, 2017, 2015, 2003, 2002 e 2001.

O que aprendemos sobre
Pensando nisso, o Futuro On-line traz como primeiro tema da série de matérias O que aprendemos sobre – que será realizada ao longo de 2025 para apresentar conceitos e dicas para sua organização financeira –, a alta da taxa básica de juros, a Selic, pois esse é um fenômeno que já ocorreu em outros momentos da economia do país e mesmo não sendo novidade, ele requer algumas mudanças de hábitos que os brasileiros podem ter ficado desacostumados, já que o último cenário de alta foi em 2022.
IPTU, IPVA, material escolar
O início do ano é caracterizado por despesas com impostos como IPTU e IPVA, assim como com a educação dos filhos, que inclui compra de material escolar, uniformes, matrícula, mensalidades etc. “O que acontece é que muitas pessoas acabam utilizando empréstimos bancários para pagar essas despesas e o aumento da taxa de juros impacta o custo financeiro desta operação”, aponta Hélio. “O ideal seria que as famílias evitassem a realização de empréstimos bancários, tendo feito a lição de casa no fim do ano passado guardando parte do valor do 13º, das férias, ou de outros rendimentos extras.”

Tesouro Direto e poupança
A alta da taxa de juros também acaba freando o ritmo de crescimento da economia, o que pode elevar a taxa de desemprego. Mas também pode ser uma oportunidade para quem faz investimentos. “O Brasil é um dos países que tem uma das taxas de juros reais mais altas do mundo e o poupador deveria aproveitar esse momento porque essa rentabilidade de juro real pode não continuar em anos subsequentes”, afirma o professor.
Nesse sentido, os produtos de renda fixa são interessantes para montar uma reserva de emergência, indica Hélio. “Um dos produtos de renda fixa mais interessantes são os títulos do Tesouro Direto vendidos pelo governo. Especificamente o Tesouro Selic é o mais adequado para o consumidor formar a sua reserva de emergência.”

No geral, os títulos oferecidos pelo Tesouro Nacional, que é a plataforma que vende os títulos direto para a pessoa física, são uma opção bem interessante de investimento, aponta o professor. “Porque ao comprar títulos do Tesouro Direto, estamos emprestando recursos para o governo, que pagará mais juros aos investidores, uma vez que a taxa de juros mais alta eleva o pagamento da dívida. Imagine que você tem um título público que está te pagando uma remuneração média de 12% ao ano, algo perto da Selic (hoje 12,25% a.a). De janeiro até o fim do ano, você tem desses 12% para uma inflação de 5% ao ano, uma diferença que representa o rendimento real dessa aplicação. Por isso esse é um tipo de investimento muito mais interessante do que a caderneta de poupança, mesmo levando em conta que na caderneta de poupança você não paga imposto de renda.” A remuneração básica da poupança é de 0,5% ao mês, acrescida da Taxa Referencial (TR). No entanto, quando a Selic está igual ou abaixo de 8,5%, a poupança paga apenas 70% da taxa de juros, o que leva o investidor a ter um rendimento real muito baixo. “Com a inflação que estamos tendo, a remuneração líquida para o investidor é muito pequena e muitas vezes pode se tornar até negativa. É como se o dinheiro depositado na caderneta de poupança estivesse perdendo o poder de compra ao longo do tempo, na medida em que a inflação está superior ao rendimento da caderneta de poupança”, explica Hélio.

Renda fixa privada e renda variável
Para a pessoa que busca uma remuneração mais elevada, o professor indica investimentos em renda fixa privada. Mas o ganho maior está atrelado a um risco maior, que é o que acontece com investimentos em renda variável, como as ações da Bolsa de Valores. “O Ibovespa tem mostrado uma rentabilidade negativa e de muita oscilação.

Como existe uma incerteza muito grande sobre o que irá acontecer em 2025 em relação ao aumento do endividamento público e em 2026 a respeito das eleições, o investimento em renda variável é para aquele consumidor que está disposto a enfrentar riscos elevados e que o objetivo seja de obter ganhos de médio e longo prazo, considerando muita oscilação na rentabilidade em um curto prazo.”
Pensando na aposentadoria
Agora se a pessoa pretende usar parte desses rendimentos quando se aposentar o professor faz um alerta. “Para quem está para se aposentar daqui a 5 anos ou 10 anos, que poupa parte dos recursos dela alocando dentro do fundo de pensão, mas também fora, os investimentos em renda variável vão trazer, principalmente nesse momento, muita oscilação. É possível correr menos risco em títulos de renda fixa, privada e públicos e que podem garantir uma remuneração conhecida. A ideia é que perto do período de aposentadoria, o investidor deveria se tornar ou ter um perfil mais conservador, porque ele terá menos anos no ciclo de vida para formar uma poupança, que é o que vai garantir o consumo dele no momento pós-aposentadoria.” Agora se esse não é o seu caso, Hélio recomenda aproveitar o momento.
“Eu já vi de tudo acontecer no Brasil. Há dois anos, falávamos em tendência de queda da taxa de juros. Hoje, as previsões são de que a inflação vai continuar acima da meta no ano que vem. Por isso, abra mão do consumo presente para você ter mais consumo futuro. Revisite seus hábitos e comece a investir.”
