Os brasileiros estão enfrentando um cenário de alta nos preços dos alimentos, causado por um conjunto de variáveis interligadas. No segundo tema da série de matérias O que aprendemos sobre, Pedro Hudson Cordeiro, professor do curso de Relações Internacionais do Ibmec Belo Horizonte, mestre em Demografia e doutorando em Economia, esclarece os motivos por que comer está tão caro e sugere medidas para mitigar os impactos no bolso dos brasileiros.

Sazonalidade: a demanda que oscila com o calendário
A sazonalidade é um dos fatores chave na alta de preços. Certos períodos do ano apresentam picos de demanda por alimentos específicos. “Por exemplo na Quaresma, muitos brasileiros, especialmente os católicos, tendem a substituir a carne vermelha por peixe e ovos. Isso aumentou a procura e, consequentemente, elevou os preços desses itens”, afirma o professor.
Outro exemplo mencionado pelo especialista é o aumento do consumo de chocolates devido à Páscoa, assim como o de milho e amendoim durante as festas juninas. Esses períodos de alta demanda criam um impacto direto nos preços, como podemos ver em um levantamento da Rico sobre a cesta de produtos típicos da Páscoa, que identificou uma alta nesses produtos nos meses que antecedem a celebração. Na categoria chocolate em barra e bombons, houve uma alta de 3,18% e 1,4%, respectivamente, enquanto o IPCA no mesmo período foi de menos de 0,16% em janeiro e 1,31% em março. Nesse sentido, o professor destaca que a tendência sazonal é difícil de controlar, pois está ligada a costumes e tradições.

Mudanças climáticas: imprevisibilidade que afeta a oferta
As condições climáticas extremas também têm contribuído significativamente para a alta dos alimentos. “Nos últimos anos, os produtores têm enfrentado instabilidades climáticas severas, como chuvas em excesso ou secas prolongadas. Por exemplo, no início de 2023, a região Sul do país e partes do Mato Grosso do Sul sofreram com uma seca intensa e temperaturas muito altas. Isso prejudicou a produção de vegetais como tomate, couve e alface, além de frutas como morango, que são extremamente sensíveis ao calor”, detalha Pedro.
Além disso, ele lembra que chuvas excessivas também podem ser prejudiciais. “Em 2022, tivemos chuvas fortes no Sul do Brasil, que comprometeram as colheitas. Essa variação climática afeta diretamente a oferta e contribui para a elevação dos preços”, complementa.

Commodities agrícolas: o impacto do mercado internacional
O comportamento do mercado de commodities também desempenha um papel importante na precificação dos alimentos. O professor explica: “soja e milho são commodities fundamentais, principalmente na produção de ração animal. O aumento da cotação desses produtos no mercado internacional impacta diretamente os custos de produção e, por consequência, os preços ao consumidor final.”
Ele menciona que eventos globais, como a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, contribuíram para manter os preços das commodities elevados. “Embora o Brasil seja um grande produtor, os preços dessas commodities são baseados no dólar, o que torna os insumos mais caros e eleva o custo de produção de alimentos como carne e ovos”, afirma.

Pedro também destaca um efeito em cadeia agravado pelas mudanças climáticas: “a seca não apenas encarece a soja e o milho, mas também reduz a qualidade das pastagens, obrigando os produtores a recorrerem à ração, que já está cara. É um ciclo que gera uma espiral de aumento nos preços.”
Questões fiscais: o papel do governo no controle da inflação
Outro ponto essencial abordado pelo especialista é a influência da política fiscal no câmbio e, consequentemente, nos preços dos alimentos. “O dólar alto encarece insumos como fertilizantes, que são majoritariamente importados. É fundamental que o governo federal adote uma política clara de controle fiscal, pois, sem isso, a depreciação do real continuará impactando a inflação e os preços dos alimentos”, destaca.
Possíveis soluções: adaptação do consumidor e responsabilidade do governo
Em um levantamento recente do Instituto Datafolha, que entrevistou 3 mil pessoas em todo país, 58% dos brasileiros reduziram a quantidade de alimentos comprados por conta da inflação. Para enfrentar esse cenário, Pedro sugere medidas governamentais claras. “O governo precisa mostrar compromisso com o ajuste fiscal e adotar uma política séria de controle dos gastos públicos”. O professor ressalta que, além de sinalizar para o mercado, o governo deve implementar medidas práticas de ajuste fiscal. “A credibilidade é conquistada com ações, não apenas com palavras.”
Já para os consumidores, ele sugere o que os brasileiros estão acostumados em tempos de crise, buscar alternativas, como substituir alimentos mais caros por opções mais acessíveis, além de mudar hábitos de lazer e consumo.
O professor conclui destacando a complexidade do tema: “estamos lidando com variáveis econômicas, climáticas e sociais que interagem de forma dinâmica. Esse cenário exige análises constantes e ações coordenadas para mitigar os impactos nos preços dos alimentos.”
