Em 27 de setembro é celebrado o Dia Nacional de Doação de Órgãos e Tecidos. O Brasil é o segundo país do mundo em números absolutos de transplantes. Segundo dados da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), a nação fica atrás dos Estados Unidos. “O Brasil tem um sistema de transplantes com muita justiça social, transparência e sem influência política, econômica ou social. Além disso, o país tem um dos mais rígidos programas de diagnóstico de morte encefálica, que foi estabelecido pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e chancelado pelo Ministério da Saúde”, afirma Huygens Garcia, presidente da ABTO.
No entanto, quando a comparação é entre o número por milhão de habitante (pmp, sigla em inglês) o Brasil cai para a 25ª posição.
“A taxa de negação familiar após a constatação da morte cerebral do paciente é muito alta. No primeiro trimestre de 2021, 41% das famílias não aceitaram doar os órgãos do parente falecido”, aponta Huygens. “Entretanto, quando a pessoa declara em vida o desejo de ser doadora, essa taxa de negação cai para praticamente zero. Por isso, a educação sobre o tema, conscientizando que a morte cerebral é irreversível, que o sistema de transplantes do país é muito seguro e que pode ser um alento para os familiares saber que a morte do ente querido vai permitir salvar a vida de muitas pessoas que podem receber os órgãos doados.”
Justamente este ponto que Rafael Paim, presidente da Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecidos (Adote), considera como a principal importância para doar órgãos e tecidos.
“A doação de órgãos é um ato de amor à vida. Ao ser um doador, a pessoa permite que outros tenham a chance de viver mais.”
Mas esse gesto teve uma redução em 2020. O levantamento da ABTO aponta que a taxa de doadores efetivos, que era de 18,1 pmp, em 2019, com projeção de crescimento para mais 20 pmp em 2020, caiu 12,7%, retornando ao patamar obtido em julho de 2017, de 15,8 pmp. “Acreditamos que um dos fatores que influenciou esses números é que houve uma diminuição no número de vagas de UTI, pois elas estavam destinadas aos pacientes com covid-19. Portanto, pacientes que tiveram um acidente vascular cerebral acabaram não tendo um local para ser atendido, impedindo o processo da doação”, explica Huygens. “Outro ponto é até que os protocolos para doação de órgãos durante a pandemia fossem estabelecidos, houve um apagão na doação”, acrescenta Rafael.
Com a aceleração da vacinação no país, a expectativa é que o número de doadores volte a crescer e que os mais de 40 mil pacientes à espera por um transplante possam ter a oportunidade de viver mais e com qualidade de vida. “Quando uma pessoa está na fila, na verdade, três ou quatro estão com ela nesta espera, pois a família está envolvida neste processo. Simbolicamente, o Brasil tem mais de 100 mil pessoas na fila de espera por um transplante. Por isso é tão importante doar órgãos e tecidos, é uma forma de ser solidário e ajudar a reduzir o sofrimento e a angústia dessas pessoas”, enfatiza Rafael.
Geralmente, um único doador pode fornecer dois rins, um fígado, um coração ou as válvulas cardíacas, um pâncreas, dois pulmões, intestino, medula. Após a morte cardíaca, também é possível doar as córneas, ossos e a pele.
Qualquer pessoa, seja adulta ou criança, com diagnóstico definido de morte cerebral. “Segundo o CFM, conceito de morte não é quando o coração deixa de bater, mas sim quando o cérebro para”, esclarece Huygens. “No Brasil, 95% dos doadores de órgãos são de pessoas falecidas. A idade não é um fator de exclusão, somente para alguns órgãos. Pessoas acima de 65 anos não podem doar o coração, eventualmente os rins também não. Mas o fígado, por exemplo, pode ser doado por alguém de até 90 anos.”
É necessário ter duas avaliações clínicas neurológicas realizadas por médicos diferentes para a confirmação da morte encefálica, com intervalo mínimo de uma hora entre cada parecer. Os neurologistas não podem fazer parte de equipes médicas que realizam transplantes, o que garante mais transparência ao processo. Após as duas confirmações de morte encefálica, é realizado um exame, como um eletroencefalograma, para comprovar que não existe mais nenhuma atividade cerebral no paciente. Também são efetuados teste sorológicos para identificar se há alguma doença infecciosa, como a covid-19, por exemplo. A família do paciente só é abordada sobre a possível doação de órgãos após a realização destes protocolos.
Rafael destaca que o profissional de saúde não pode pedir o órgão do ente falecido aos familiares, mas sim oferecer à família o direito de exercer sua vontade ou mesmo a do próprio paciente de doar os órgãos. “O profissional oferece esse direito de exercer o amor à vida, praticando a solidariedade com o próximo.”
Embora qualquer pessoa possa declarar em vida à vontade de querer doar os órgãos após a morte, a lei (nº 9.434/2.007) brasileira exige a autorização do cônjuge ou parente maior de idade, até o segundo grau, para a retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas. Portanto, se a família não autorizar, a doação dos órgãos não será realizada. Para ajudar nesta conscientização familiar, a Adote lançou uma carteirinha simbólica de doador – baixe aqui – que pode ser compartilhada para aumentar a ciência de parentes e amigos sobre a intenção de ser um doador. Quando a família tem o conhecimento desta intenção, ela é respeitada no pós-morte.
Pacientes com diagnóstico positivo para covid-19, com câncer, doença infecciosa grave aguda ou doenças infectocontagiosas, como HIV, as hepatites B e C e doença de Chagas. Qualquer doença que possa ser transmitida para quem irá receber órgãos doados impossibilita a doação.
Um dos rins, parte do fígado, medula óssea. Neste caso, o doador deve ser parente do receptor em até quarto grau – como pais, filhos, irmãos, etc. – e possuir compatibilidade sanguínea. Caso o doador não seja um parente relacionado, é necessária autorização judicial.